Por Rodrigo Oliveira

As civilizações mais vigorosas não são aquelas que mudam constantemente. Muito pelo contrário, a percepção de mudança nelas é muito mais lenta.

A Capela Sistina é a mesma que foi contemplada por Michelângelo, assim como a Fontana di Trevi, que foi admirada por Schopenhauer.

No comércio, há quem compre na esquina o mesmo doce, bolo ou pão que compravam seus bisavós.

O cheiro, a textura, o gosto, tudo permanece idêntico, sem nenhum tipo de mudança. A tradição é passada de avô para neto, de pai para filho.

Na sua Poética do Espaço, Bachelard analisa cada cantinho da casa. Em todos os lugares, há uma característica da nossa alma. Pois na nossa alma também existem gavetas, porões e sala de estar. A minha casa, em algum grau, é uma espécie de espelho da minha alma.

A esse ‘espelhamento’ damos o nome de ‘identidade’. É justamente essa identidade que nos fornece um senso de respeito e cuidado com o lugar em que estamos. É uma relação que nos transmite uma sensação de pertença e estabilidade.

Quando Mariana e Brumadinho foram soterradas, fiquei pensando também no passado das pessoas, no lugar em que elas criaram identidade, na pracinha onde cresceram brincando, nas fotografias, nas lembranças que cada um criou. Tudo isso foi soterrado.

Hoje, no Rio Grande do Sul, o estrago é semelhante. Com a inundação, as pessoas também perderam esse passado, essa memória, esse sentido profundo de viver.

Refazer isso demanda tempo. Muitos precisarão de auxílio psicológico. A estabilidade de antes não existe mais. O desenraizamento foi profundo e chocante.